quarta-feira, 9 de maio de 2012

Paraísos Artificiais - Sentimentos lisérgicos

Uma história de amor movida pelo destino e pelo desejo se sentir inteiro, embalada em viagens alucinógenas, música eletrônica e belas paisagens


Se você é "careta" e não curte drogas como cocaína, peiote, ecstasy, GHB (nunca tinha ouvido falar dessa) e afins, haverá um certo incômodo em assistir Paraísos Artificiais (2012), de Marcos Prado. Durante boa parte do longa, a sensação é que as drogas são um diverso e atraente bouquet de sensações transcedentais, desabrochando alegrias e incentivando interações sociais, sem nenhuma consequência.

Porém, se você é do tipo que "curte isso no Facebook", não terá do que reclamar - só não vale chiar hipocritamente dizendo que raves não tem nada a ver drogas, hein? Rodado na Praia do Paiva (Pernambuco), em Amsterdã e no Rio de Janeiro, Paraísos Artificiais não perde tempo discutindo os males dos entorpecentes nem trata o assunto com hipocrisia. Mostra sim que as raves e boates tem dessas coisas e que tem gente bem de vida enfiado até o pescoço nelas.

A narrativa fragmentada em três momentos e lugares diferentes, tão picotada que confunde no início, mais ou menos como em Amnésia, conta o relacionamento de três jovens a partir de um evento puramente casual e os desdobramentos que acontecem em suas vidas após esse encontro. Tudo embalado com música eletrônica e cultura rave. Se você não se identifica com nada disso, o filme será um pouco cansativo. Mas acredite, o "sacrifício" valerá a pena.

Até porque, tirando a excessiva presença desses elementos, o que fica verdadeiramente é uma história de amor não ortodoxa, mas onde o sentimento e a vontade de ser feliz estão presentes. Porém, essa felicidade não vem sem custo, muito menos sem dor. Tudo bem que em alguns momentos rola um certo ar novelesco, mas isso não tira o mérito do filme.

Erika (Nathalia Dill, em sua primeira protagonista no cinema e num papel ousado) é uma DJ brasileira que está fazendo seu nome em festas pela Europa. Nando (Luca Bianchi, uma cara relativamente nova) viaja até Amsterdã para realizar um negócio escuso e encontra Erika, com a qual vive um romance digno de sonho. E Lara (Lívia de Bueno) é uma grande amiga de Erika - diria até "algo mais" - que acompanha o início da carreira da DJ numa festa em Pernambuco.

Entre idas e vindas no tempo, o acaso comanda as situações, e, como já foi dito, confunde à princípio. Mas as pontas soltas vão se resolvendo lentamente, num passo lisérgico, até a cena de sexo mais criativa e chocante do filme - calma, nenhuma prática bizarra é mostrada. Apenas um fato que ocorre durante a cena e que dá estalo final na cabeça do espectador (se isso já não aconteceu até aqui), ligando muitos pontos anteriores e dando sentido ao todo.

Marcos Prado, diretor do fascinante Estamira, se arriscou na ficção e acertou a dose. Conseguiu fazer uma abordagem sobre drogas que não ficou puramente na crítica social, nem se perdeu no romance açucarado. A fotografia de Lula Carvalho também ajuda demais, compondo a atmosfera opressiva do presente de Nando, o clima alucinante das boates eletrônicas e o momento bucólico em Amsterdã. Para a produção, contou com o parceiro José Padilha. Interessante esse "revezamento" de tarefas, já que Prado foi produtor dos dois Tropa de Elite e de Ônibus 174, dirigidos por Padilha. Ou seja, aquele velho ditado de "em time que está ganhando, não se mexe" ainda faz algum sentido.

Paraísos Artificiais
Nota - 7.6/10



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Um comentário:

João de Campo Grande disse...

Bem escrita! Pena que quase tudo é Rede Globo, em termos de cinema brasileiro. Espero assistir ao filme, em breve!