segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

O Sem Sentido Que Interessa


No universo altamente competitivo dos seriados, uma questão me chamou atenção recentemente, graças a uma conversa entre amigos.


Outro dia, por puro acaso, assisti no SBT (num horário terrível, às quatro da manhã) um episódio do seriado Pushing Daisies. Simplesmente a coisa mais linda que já vi em termos de seriado! Era um episódio (ainda não descobri qual foi, só sei que foi da segunda temporada, pois é esta que está sendo exibida pelo canal) onde o confeiteiro tem que encarar o cara que morreu no lugar de sua amada Chuck: um dos gêmeos dono da funerária onde Chuck estava quando foi trazida de volta. De fato, acontecia muita coisa no episódio. Mas acima de tudo, o que me chamou atenção na série foi o non-sense legal que ela tinha.

Vejamos, o que esperar de uma série onde o protagonista tem o poder de ressucitar os mortos com apenas um leve toque e que, passado um determinado tempo, caso não toque novamente no ex-morto, alguém aleatoriamente morre no lugar enquanto o outro fica vivo? E mais, o pobre milagreiro – um confeiteiro chamado Ned – não pode tocar novamente nos ressucitados, ou eles voltam a morrer e não podem ser trazidos de volta.

Esse é o dilema de Ned. Após trazer a mulher que ama, a amável e meio amalucada Chuck, não pode tocá-la, ou ela volta para a terra dos pés juntos sem passagem de volta. As saídas que os dois arranjam para poder se tocar e curtir fisicamente esse amor são hilárias. Cada episódio é cheio de reviravoltas estranhas, com personagens secundários dando o ar de sua graça com backgrounds bem trabalhados. Nada está ali por acaso, por excesso. Um non-sense que agrada.

Em contraponto a Daisies está Lost. Há muito que deixei de acompanhar o seriado. Assisti a primeira temporada quase toda, a segunda foi mais esparsa. Não vi nada da terceira e da quarta. Estou acompanhando a quinta pela Globo. E sinceramente, me irrita ver como ainda idolatram essa série!

Nos primórdios de Lost, era empolgante assistir os perigos por que passavam Jack Sheppard e sua turma, numa ilha no meio do nada, com ursos polares, monstros e os "outros". Os flashbacks dos personagens eram demais. A série prendia você com cada detalhe perturbador que surgia. A segunda temporada acompanhou a mesma qualidade, embora o lance de "sobreviventes-do-restante-do-avião" foi meio forçado... Aquela coisa de "como vamos enfiar um monte de personagens novos pra manter o interesse da audiência, já que não dá pra ficar só com os que temos?". Fui vendo, fui vendo... E quando acabou, não me deu o mesmo estímulo de continuar para a terceira. Temporada esta que ficou marcada, para nós brasileiros, pela vergonhosa participação de Rodrigo Santoro. A quarta, eu nem sei o que dizer.

Ficamos então com a quinta. A Globo exibiu um "episódio-resumo", com tudo o que aconteceu nas temporadas anteriores e adiantando algumas coisas que iam acontecer nessa. Legal, principalmente para quem não acompanhava o universo Lost há algum tempo.
Estou demonstrando uma relativa fidelidade ao seriado. Perdi apenas um (talvez dois) episódios. E falo com toda sinceridade que não o tenho assistido apenas para ter o que opinar a respeito. E meu veredito até agora é: eles realmente se perderam.

A impressão que fica é que nada precisa mais ter alguma lógica. A ilha tornou-se um deus cujas vontades são inexoráveis. Viagens no tempo sem o menor sentido - e cuja única solução, adivinha qual foi? Trazer os que escaparam de volta - personagens imortais e/ou oniscientes (como Richard e Locke), posturas ridiculamente justificadas (como a de Kate ao salvar Ben criança), entre outras coisas, já encheram a paciência e me fizeram (assim como a muitas outras pessoas mundo afora) a não aguentar mais Lost. Nos episódios de 20/01 (quarta) e 21/01 (quinta), eu vi a maior demonstração de "forcação de barra" no mundo! No ep. de quarta, Ben Linus, na sua versão moleque, leva um tiro e é salvo pelas pessoas que ele aterrorizou até então! No de ontem, Ben adulto é absolvido pela ilha e agora se vê obrigado a seguir as ordens de Locke! Ah, faça-me o favor! Cada vez menos está valendo a pena ficar acordado para assistir tamanha apelação!

Tudo é a ilha, a vontade da ilha, blá, blá, blá... Uma tremenda chatice. Fora que já se vão duas semanas de exibição e até agora, nada. Só enrolação, narrativas desnecessariamente fragmentadas e canseira no telespectador. Não me admirará se, na temporada final, tudo acabar sem a menor explicação – e sem sentido, por puro capricho dos roteiristas.

Fosse nesse meio termo – entre o nonsense costurado e tranquilo e o nonsense forçado e (cada vez mais) enrolado – que fiquei a pensar... Pushing Daisies durou duas temporadas (9 eps. na primeira e 13 na segunda), enquanto Lost já ultrapassou os 100 eps. em suas cinco temporadas – e com a sexta na agulha. Qual o segredo do fracasso de uma e do sucesso da outra? Ambas apelam para o nonsense, o inexplicável e o misterioso na vida de pessoas absolutamente comuns. Por que o nonsense de Daisies não pegou? Por que era "fofinho"? "Bonitinho"? Será que o nonsense só pode ser usado de forma carregada de suspense, de um certo terror? Não poderia ser usado com humor (negro, muitas vezes), com ironia, com romance? Por que então uma série extremamente forçada como Lost faz sucesso, quando já são notáveis os sintomas de desespero e cansaço de seus roteiristas?

Bem, não tenho uma conclusão para o assunto, como alguns poderiam esperar, após tantas linhas. Mas creio que cada um, pensando um pouco, chegará a sua. De minha parte, cansei de esperar algo de Lost. Quem sabe a ilha deixe os roteiristas trabalharem em paz...

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Cultura inútil: segundo o Wikipedia, Lost também é um vilarejo na Escócia... Será que a ilha aceita concorrência? :D

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