As diferenças culturais entre Oriente e Ocidente muitas vezes são gritantes. Mas se tem um traço cultural que eu nunca conseguirei entender é o tal do mercado editorial de mangás.
No Japão, é absolutamente normal que um mangá leve 10 anos pra ser concluído. Dez longos anos! Não, isso não quer dizer que tem uma revista todo mês na banca ou na livraria. É um volume compilado por semestre, quando uma série está mais ou menos no auge!
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Tem mangá que está no mercado há mais de 20 anos e ainda não tem a menor cara de “está chegando ao fim”. Os japoneses literalmente crescem lendo seus heróis favoritos e talvez por isso, para culturas estrangeiras, isso seja visto como um hábito infantil. Difícil realmente acreditar que alguém compre Dragon Ball por, sei lá, 13 anos e dizer que o interesse na obra se manteve intacto de início ao fim. O gosto, a rotina diária, a maturidade... Tudo muda nesse espaço de tempo tão grande. Uma década modifica o sujeito demais. Não consigo acreditar que o cara que começou a ler Berserk em 1989 chegou em 2011 sem nenhuma mudança na sua vida. Digamos que o sujeito tivesse 14 anos na época do lançamento do mangá. Ele estaria agora com 36. Será que ele tem o mesmo tempo para ler seu mangá de horror-fantasy como tinha aos 14? Será que ele ainda se interessa por essa temática?
Acho que o mercado japonês de quadrinhos sobrevive mais dos herdeiros do que propriamente dos leitores antigos. Lá também tem o lance das coletâneas, com várias séries saindo na mesma revista. Grandes como listas telefônicas, essas revistas publicam, semanal ou mensalmente, vários títulos, mas apenas UM capítulo. É quase como acompanhar um seriado de TV. E depois de um determinado número de capítulos publicados – que geralmente fica em torno de nove, mas tudo depende da editora – então chega a hora de compilar a série. Os capítulos são republicados num volume chamado de tankobon ou tankohon – que é a referência para publicações fora do Japão, já que os outros mercados não se adaptariam a essa insanidade editorial.
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O pior desse sistema mal assombrado é que ele influencia outros países, quando os títulos são exportados. Só aqui no Brasil, devem ter mais de 10 mangás paralisados por alcançarem a edição japonesa. Dentre eles, Hunter x Hunter, Evangelion, Vampire Knight e, em breve, o próprio Berserk.
E ainda há o risco sério de cancelamento se houver uma mínima baixa nas vendas. Shaman King foi concluído às pressas pelo simples fato de não figurar mais entre os top 5 de mais vendidos no Japão. Ao invés do desfecho pretendido, o autor Hiroyuki Takei recebeu o ultimato da editora e foi obrigado a dar um final “nas coxas” para seu mangá – final este que ficou horrível, por sinal.
Agora, me diga, como alguém pode passar tanto tempo escrevendo/desenhando um mesmo troço sem enlouquecer?
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Wesley Prado é recifense, leonino, quase jornalista e nostálgico. Lembra da queda do Muro de Berlin. Simplesmente louco por quadrinhos, RPG, livros e cinema. Criador do Caixa da Memória, mas humilde demais para querer ser chamado de deus ou papai.
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